Por: Valéria Giglio Ferreira – Psicóloga.
“Gostaria de iniciar a pauta da "Síndrome do Ninho Vazio" com um ditado que diz: "... os filhos são mestres em transformar marido e mulher em pai e mãe vinte e quatro horas por dia".
Mas esta é apenas uma parte da questão.
A outra é que se inúmeras vezes marido e mulher se deixam levar pelo excesso de solicitação dos filhos(as), também fazem isto por motivos pessoais, motivos que lhes são próprios e que dizem respeito à dinâmica de seu casamento.
Dar mais atenção aos filhos(as) do que ao cônjuge também remete às facilidades e atalhos que cuidar mais dos filhos(as) do que de seu casamento traz como fonte amenizadora de ansiedades e como fonte de homeostase (equilíbrio) para suas disfunções conjugais e familiares.
Explicando melhor: via de regra, é mais fácil se relacionar com os filhos(as) do que com o(a) parceiro(a), pois, a relação entre pais/mães e filhos(as) é de natureza hierárquica e no limite dos conflitos os progenitores mandam e suas crias obedecem; todavia, com a relação a dois é diferente, porque sendo natureza simétrica não há como os parceiros mandarem um no outro, de modo que tudo tenha que ser negociado e isto, com certeza, dá muito mais trabalho, implicando ainda em colocar-se num estado de maior vulnerabilidade física e emocional.Um outro fator é que as relações com os filhos(as) tem a proteção da consanguinidade e da filiação e a relação conjugal não possui este dispositivo, sendo portanto, uma relação mais vulnerável e susceptível à rompimentos, o que costuma desencadear desconfianças que dificultam em muito a entrega - requerida e pressuposta em tão íntimo e profundo envolvimento.
Assim, por estes e por tantos outros fatores, muitas vezes, marido e mulher se ligam mais aos filhos(as) do que um ao outro.
Enfraquecem o casal conjugal e fortalecem o casal parental contando com a questionável premissa de que os filhos(as) talvez possam "amarrar, colar, segurar o casamento de seus pais".
Mas, sabemos que não.
Sabemos, que os filhos(as) até podem segurar o CASAL PARENTAL, ou seja, segurá-los como pai e mãe morando na mesma casa, mas, jamais conseguiriam segurar o CASAL CONJUGAL.
Os filhos(as) jamais seriam capazes de preservar o desejo, a atratividade, o carinho e a vontade dos cônjuges de compartilharem suas almas um com o outro.
Esta é tarefa do próprio casal.
Os filhos(as) jamais poderiam , nem deveriam se incumbir de realizar tal missão.
Então, ao longo de décadas de não cultivo da planta amorosa, de não a regarem, de não a podarem, de não a adubarem, este descuido para com a relação conjugal amorosa tende, pouco a pouco, a enfraquecê-la e até esvaziá-la.
As consequências desta dinâmica começam a se manifestar mais claramente quando a família chega à fase adulta das crias: os filhotes cresceram e estão prontos na hora de deixar o ninho dos pais.
É com a iminência da saída deles que o casal se dá conta de seu casamento gravemente desvitalizado, esvaziado.
Surge a chamada SÍNDROME DO NINHO VAZIO: nela encontra-se a possibilidade de um casal novamente a sós e com seu relacionamento a dois perdido em décadas de abandono conjugal recíproco.
Verifica-se então, um ninho vazio da presença dos seus filhotes, mas, também vazio de afeto, afinidades, admiração, desejo, carinho, etc. entre marido e mulher.
Neste momento, a tendência do tipo de casal que deixou de cuidar da relação para se dedicar somente a outras coisas, principalmente, ao cuidado único e exclusivo com prole é a de segurar um ou tantos quantos possíveis dos filhotes no ninho PARA EVITAR O CONFRONTO COM UMA RELAÇÃO QUE PERDEU SEU MOVIMENTO, SUA DANÇA, SEU SENTIDO, SUA VALIDADE, INTIMIDADE E SUA GRAÇA.
Graça no sentido de a relação ser vista como benção, mas, também, como diversão, como lúdica, prazerosa, satisfatória.
Nesta hora, muitas vezes, as afinidades que haviam unido o casal lá trás, foram esquecidas ou deformadas pelo peso do distanciamento físico e afetivo.
O olhar de ambos já não pode se encontrar, pois, descortinaria tantos e tantos ressentimentos acumulados entre brigas mal resolvidas e satisfações não alcançadas, que o toque das mãos virou tabu e coisa do passado, de um passado de desejo e encanto que não ousam lembrar mais.
Neste estado, a relação costuma apresentar problemas não resolvidos que o tempo cronificou e cristalizou.
Nesta altura, as brigas não costumam ser para resolver conflitos, mas, para reiterar a imagem distorcida que cada parceiro(a) construiu do outro e a qual fazem questão de confirmar no dia a dia do relacionamento para si e para os de fora: "seu pai é assim...sua mãe é assim...".
De modo geral, todos os filhos(as), mas, costumeiramente um deles mais do que os outros, passa a ser refém do casamento falido desses pais.
Este filho(a) eleito, que passa a ter a função de "cola" e/ou compensação do casamento quebrado ou rompido de seus pais, vai desenvolvendo os sintomas típicos deste emaranhado familiar: dificuldade de ter vida própria, seguir seu caminho individual e ser feliz em sua própria parceria amorosa.
A um filho(a) nesta situação, de maneira consciente ou inconsciente, não é dada permissão para que se desenvolva com naturalidade em direção a sua vida adulta, principalmente, quanto a ter sua própria família e/ou assumir funções profissionais o levaria para longe do ninho parental.
Seu conflito é: se ele sai do ninho imagina que estará abandonando os pais um ao outro, e disto costumam decorrer imensos sentimentos de culpa e de ameaça a respeito do que será deles na sua ausência.
Nesta posição de prisioneiro inconsciente do casamento disfuncional dos seus pais, este filho(a) costuma iniciar um processo de acusar de abandono e descaso os irmãos que escaparam ao cerco familiar, pois, alegam que eles deixaram os pesados pais a seu único cargo.
A contrapartida é que esses filhos usualmente, são os chamados(as) "queridinhos de papai e mamãe", mas, o preço desta honraria e distinção é muito alto e muitos não tem a consciência disto, nem a coragem de deixar o "conforto" das opressoras, mas, protetoras asas parentais para ver o mundo sob sua própria perspectiva.
Assim, temos alertado os casais sobre a necessidade de reversão desta dinâmica familiar destrutiva e doentia, de modo que marido e mulher possam fortalecer o vínculo conjugal e lá na vida adulta de seus filhos(as) não se sintam tentados a retê-los no ninho em prol de protegê-los ou de proteger seu próprio casamento: ESTA NÃO É FUNÇÃO DOS FILHOS/AS.
A principal maneira de evitar ou, pelo menos, tentar minimizar os efeitos nocivos da "Síndrome do Ninho Vazio" é o casal se conscientizar de que marido e mulher precisam assumir que seu casamento é responsabilidade sua e zelar por ele e pela vitalidade da relação conjugal desde o seu princípio até os anos da velhice, se assim for, ou, tanto quanto ele durar com seus erros e acertos.”
Imagem: Foto pessoal de uso exclusivo do Blog: Sou mulher, sou mãe e sou feliz.
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Ferreira, Valéria Giglio - Blog AMAR- EDUCAÇÃO CONJUGAL E FAMILIAR.